5º CAPITULO
A HORTA
A horta começava por ali, uma peça de horta, como lhe chamava a família, que era apenas cerca de três metros de terreno em largura, e de comprimento indeterminado, sendo assim em socalcos dividida até chegar ao ponto mais baixo.
Entre cada socalco e no comprimento da peça, havia sempre latadas de videiras, harmoniosamente seguras umas nas outras com paus de oliveira espetados na vertical, com canas na horizontal, formando as latadas, e tudo isto e mais a poda e enxertia das videiras era feito pela Julieta, que tudo sabia fazer dentro daquela fazenda.
Dando início à horta havia uma nascente de água, principalmente porque, sem água, não poderia haver horta, e ali estava uma grande nascente que saía de uma mina tapada, noite e dia a jorrar uma corrente de água sem fim, na saída dessa nascente um tanque enorme, em profundidade e largura, e dali se regava metade da horta que era muito grande.
A água saía do tanque naturalmente apenas pela força da gravidade, depois de abrir uma das saídas do tanque na altura própria do terreno que se pretendia regar, havendo ainda outra maneira para fazer a rega, a alguma peça de horta que ficava mais alta.
Essa outra forma era a de retirar do tanque a braços, com um cabaço, em ritmo constante, e colocar no inicio da regadeira - numa espécie de calha - fazendo correr assim um caudal certo e, com a ajuda de outra pessoa, fazer a distribuição da água por cada canteiro, e assim se regavam essas peças.
Muitas eram as árvores de toda a variedade de fruta que estavam distribuídas por toda a horta, ameixas de muitas espécies, pessegueiros, damasqueiros, pereiras, figueiras, nespereiras, marmeleiros e, bem perto do tanque, havia uma nespereira muito grande, era das árvores maiores da fazenda, competia com as oliveiras ou figueiras maiores.
Quando estava toda florida em cachos era lindíssima. Certa vez casou uma vizinha e Dalila incentivada pela mãe foi apanhar flores da nespereira para atirar à noiva, eram tão branquinhas, bonitas para uma noiva. Esta é apenas uma lembrança curiosa de criança.
Mas muito mais interessante era subir todas estas árvores quando os frutos estavam maduros, e comê-los ali mesmo no cimo de cada tranca, de cada galho ou de cada ramo, que são apenas vários termos, para descrever o mesmo prazer, de muitas recordações:
Peças de feijão verde, trepavam pelas canas, cortadas das caneiras que abundavam na fazenda no tempo certo para o seu corte, canas limpas e atadas em molhos, e as mais grossas eram até cortadas em duas alturas e serviam para colocar nas latadas das uvas ou nas vinhas, em ajuda de suporte para o equilíbrio da cepa e do peso dos frutos.
Por sua vez as mais finas eram para aplicar então nos canteiros de feijão, aí colocadas habilmente pela Julieta, uma verdadeira agricultora conhecedora dos seus recursos e incansável no trabalho.
Nesses canteiros de feijão verde trepadiço, ele estava pois disposto e agarrado em rocas, como Julieta lhe chamava, que nada mais eram do que seis canas espetadas na terra frente a frente e à distancia dos pés de feijão, e atadas com juncas, todas unidas acima da altura média de uma pessoa.
Chegava o Outono e era a altura de cavar as peças para plantar as couves, iam-se arrancando as culturas de Primavera e Verão já em fim de vida, e logo Julieta preparava o mesmo terreno para a plantação de couve portuguesa ou de sete semanas, coração de boi, lombardas, e até as couves altas que eram plantadas nos combros à volta das peças.
Essas couves normalmente criavam-se com outra finalidade que não a de corte: deixava-se crescer à vontade, e quando não havia outras serviam para retirar folhas para a criação, e ainda para se deixarem grelar e depois cortar os grelos para comer ou vender antes de florirem.
Ainda havia outra coisa que a Julieta fazia: algumas couves que se deixavam ir florescer, após as flores davam lugar às sementes que, cresciam, amadureciam e, quando começavam a secar, Julieta enfiava uma saca em torno do grande ramo de sementes, evitando assim que as vagens ao abrir, de tanto estarem secas do sol, começassem a tombar na terra.
Eram sementes muito fininhas, bolinhas mínimas, que era preciso guardar para fazer as sementeiras do próximo ano, e assim era feito com todas as qualidades, para criar sempre novas sementes. Assim se fazia igualmente com as outras culturas, secavam-se de todos os cereais, feijão, grão-de-bico, chícharos, favas, ervilhas, etc.
Todas estas coisas criadas nesta fazenda, serviam para a alimentação familiar, mas não só, Julieta ia vender à praça de Santarém, tinha dias certos para tal, os dias em que ela sabia serem de melhor venda. Levava as couves limpas dentro de sacas de linhagem, o feijão verde também, as frutas em cestas de verga ou feitas de canas, sacos de batatas, ou até galinhas dentro de cestos, com os pés atados, e cobertas com um pano atado nas pontas, duas a duas.
Até as cestas vinham da fazenda, pois havia algumas árvores de vime no ribeiro. Esse vime era oferecido a um homem que costumava ir cortá-lo e que, depois, por sua vez, oferecia sempre um cesto menor ou maior, conforme a quantidade que teria apanhado. Mas não era o único.
Autora Lídia Frade em a Fazenda onde veio a luz ao Mundo
A HORTA
A horta começava por ali, uma peça de horta, como lhe chamava a família, que era apenas cerca de três metros de terreno em largura, e de comprimento indeterminado, sendo assim em socalcos dividida até chegar ao ponto mais baixo.
Entre cada socalco e no comprimento da peça, havia sempre latadas de videiras, harmoniosamente seguras umas nas outras com paus de oliveira espetados na vertical, com canas na horizontal, formando as latadas, e tudo isto e mais a poda e enxertia das videiras era feito pela Julieta, que tudo sabia fazer dentro daquela fazenda.
Dando início à horta havia uma nascente de água, principalmente porque, sem água, não poderia haver horta, e ali estava uma grande nascente que saía de uma mina tapada, noite e dia a jorrar uma corrente de água sem fim, na saída dessa nascente um tanque enorme, em profundidade e largura, e dali se regava metade da horta que era muito grande.
A água saía do tanque naturalmente apenas pela força da gravidade, depois de abrir uma das saídas do tanque na altura própria do terreno que se pretendia regar, havendo ainda outra maneira para fazer a rega, a alguma peça de horta que ficava mais alta.
Essa outra forma era a de retirar do tanque a braços, com um cabaço, em ritmo constante, e colocar no inicio da regadeira - numa espécie de calha - fazendo correr assim um caudal certo e, com a ajuda de outra pessoa, fazer a distribuição da água por cada canteiro, e assim se regavam essas peças.
Muitas eram as árvores de toda a variedade de fruta que estavam distribuídas por toda a horta, ameixas de muitas espécies, pessegueiros, damasqueiros, pereiras, figueiras, nespereiras, marmeleiros e, bem perto do tanque, havia uma nespereira muito grande, era das árvores maiores da fazenda, competia com as oliveiras ou figueiras maiores.
Quando estava toda florida em cachos era lindíssima. Certa vez casou uma vizinha e Dalila incentivada pela mãe foi apanhar flores da nespereira para atirar à noiva, eram tão branquinhas, bonitas para uma noiva. Esta é apenas uma lembrança curiosa de criança.
Mas muito mais interessante era subir todas estas árvores quando os frutos estavam maduros, e comê-los ali mesmo no cimo de cada tranca, de cada galho ou de cada ramo, que são apenas vários termos, para descrever o mesmo prazer, de muitas recordações:
RECORDAÇÕES
Recordo os pássaros
Chilreando nos salgueiros
E o vibrante cantar das rãs
Na corrente lenta dos regueiros.
E chapinhar descalça, livremente
Na água límpida da rega
Que corria docemente.
Recordo…
A música suave, tocada pelas brisas
Na folha das caneiras
E o brincar às casinhas
Sob a grande copa das nespereiras.
Recordo ainda, quando subia a cada árvore
Ofegante de ansiedade
Escalando o ramo mais alto
Sentir total liberdade.
Apanhar a fruta fresca,
Que mais me fosse de agrado
Comê-la ali, reluzente e sumarenta,
Que prazer, só hoje valorizado.
Já no terreno plano, que era o mais difícil de cultivar e ficava encharcado até muito tarde, havia uma ribeira a meio por onde passavam todas as águas que vinham de alguns quilómetros em redor, mas tudo era mesmo assim cultivado.
Chilreando nos salgueiros
E o vibrante cantar das rãs
Na corrente lenta dos regueiros.
E chapinhar descalça, livremente
Na água límpida da rega
Que corria docemente.
Recordo…
A música suave, tocada pelas brisas
Na folha das caneiras
E o brincar às casinhas
Sob a grande copa das nespereiras.
Recordo ainda, quando subia a cada árvore
Ofegante de ansiedade
Escalando o ramo mais alto
Sentir total liberdade.
Apanhar a fruta fresca,
Que mais me fosse de agrado
Comê-la ali, reluzente e sumarenta,
Que prazer, só hoje valorizado.
Já no terreno plano, que era o mais difícil de cultivar e ficava encharcado até muito tarde, havia uma ribeira a meio por onde passavam todas as águas que vinham de alguns quilómetros em redor, mas tudo era mesmo assim cultivado.
Peças de feijão verde, trepavam pelas canas, cortadas das caneiras que abundavam na fazenda no tempo certo para o seu corte, canas limpas e atadas em molhos, e as mais grossas eram até cortadas em duas alturas e serviam para colocar nas latadas das uvas ou nas vinhas, em ajuda de suporte para o equilíbrio da cepa e do peso dos frutos.
Por sua vez as mais finas eram para aplicar então nos canteiros de feijão, aí colocadas habilmente pela Julieta, uma verdadeira agricultora conhecedora dos seus recursos e incansável no trabalho.
Nesses canteiros de feijão verde trepadiço, ele estava pois disposto e agarrado em rocas, como Julieta lhe chamava, que nada mais eram do que seis canas espetadas na terra frente a frente e à distancia dos pés de feijão, e atadas com juncas, todas unidas acima da altura média de uma pessoa.
Chegava o Outono e era a altura de cavar as peças para plantar as couves, iam-se arrancando as culturas de Primavera e Verão já em fim de vida, e logo Julieta preparava o mesmo terreno para a plantação de couve portuguesa ou de sete semanas, coração de boi, lombardas, e até as couves altas que eram plantadas nos combros à volta das peças.
Essas couves normalmente criavam-se com outra finalidade que não a de corte: deixava-se crescer à vontade, e quando não havia outras serviam para retirar folhas para a criação, e ainda para se deixarem grelar e depois cortar os grelos para comer ou vender antes de florirem.
Ainda havia outra coisa que a Julieta fazia: algumas couves que se deixavam ir florescer, após as flores davam lugar às sementes que, cresciam, amadureciam e, quando começavam a secar, Julieta enfiava uma saca em torno do grande ramo de sementes, evitando assim que as vagens ao abrir, de tanto estarem secas do sol, começassem a tombar na terra.
Eram sementes muito fininhas, bolinhas mínimas, que era preciso guardar para fazer as sementeiras do próximo ano, e assim era feito com todas as qualidades, para criar sempre novas sementes. Assim se fazia igualmente com as outras culturas, secavam-se de todos os cereais, feijão, grão-de-bico, chícharos, favas, ervilhas, etc.
Todas estas coisas criadas nesta fazenda, serviam para a alimentação familiar, mas não só, Julieta ia vender à praça de Santarém, tinha dias certos para tal, os dias em que ela sabia serem de melhor venda. Levava as couves limpas dentro de sacas de linhagem, o feijão verde também, as frutas em cestas de verga ou feitas de canas, sacos de batatas, ou até galinhas dentro de cestos, com os pés atados, e cobertas com um pano atado nas pontas, duas a duas.
Até as cestas vinham da fazenda, pois havia algumas árvores de vime no ribeiro. Esse vime era oferecido a um homem que costumava ir cortá-lo e que, depois, por sua vez, oferecia sempre um cesto menor ou maior, conforme a quantidade que teria apanhado. Mas não era o único.
Autora Lídia Frade em a Fazenda onde veio a luz ao Mundo
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