13º CAPITULO
O Dia de Todos os Santos era um dia muito importante na infância de Dalila, pelo menos naquele ano era a primeira vez que ia à Feira dos Santos e isso fazia a diferença, para o pai, contudo, era por outros motivos, ele gostava das feiras por gostar de fazer os seus negócios.
Para Julieta era o prazer de partilhar naquele dia um programa com o marido, e em família, coisa que pouco acontecia, o que portanto a deixava muito feliz. Todo esse dia era preparado e pensado muitos dias antes, pelo menos por Julieta, que tinha as filhas e farnel para arranjar.
Deodato só se preocupava com o transporte que ele já tinha preparado ao pormenor, era a pintura da carroça que serviria para transportar toda a família e que já tinha sido toda pintada de azul, as ferragens eram pintadas em preto, e o pai tinha até colocado umas rodas de carro, ou rodas de pneu adaptadas na carroça, e estava pois toda bonita a geringonça.
Ele gostava muito de a modificar a seu jeito, era como se fosse o seu verdadeiro carro. Depois vinha o abrilhantar dos metais que ornamentavam os arreios do macho, o cabedal era ensebado com sebo de carneiro que o pai sabia preparar, e nos arreios todas as fivelas de metal amarelo estavam reluzentes, assim como a guizeira, com seus guizos de cobre pendurada no pescoço, brilhante e tocante - com o trotar do macho faziam uma música constante que se ouvia a larga distancia.
Todas as pessoas olhavam, dava nas vistas, com uns enfeites de rabos de raposa muito lindos com fitinhas de várias cores, por sua vez dependurados, um de cada lado das orelhas - o pai era mesmo muito vaidoso com todos aqueles apetrechos da carroça e respectivo macho, para a viagem.
Julieta tinha morto uma boa galinha na véspera. De manhã acendeu o forno de lenha, bateu um bolo, apressadamente, para aproveitar o mesmo calor e cozer tudo de uma só vez. Estando o forno devidamente aquecido, nele foi colocado o bolo, assim como a galinha a corar, já previamente meia cozida, e barrada com tempero, e no entretanto foi fazendo um arroz no caldo da galinha, meio cozido coloca-o depois no tabuleiro à volta da ave, mais rodelas de chouriço a decorar o arroz. Volta tudo ao forno para acabar de cozer e corar, e ali estava preparado o grande almoço que seria comido na feira do Cartaxo, a feira de Todos os Santos.
O PÃO POR DEUS
Depois do banho tomado, dentro do grande alguidar que lhes servia de banheira, a mãe vestia-as com a melhor roupa, como nesta ocasião para irem à feira. Dalila e sua irmã Amália, como eram as mais velhas, andavam quase sempre vestidas de igual, diga-se a propósito, e até os seus sapatos pretos eram iguais e feitos de encomenda ao sapateiro da serra, como lhe chamavam, que seria da Benedita, terra de sapateiros.
Ele ia por todas aquelas pequenas aldeias, tirava o molde do pé num papel pardo, um risco de lápis, fazendo o molde do pé, e de volta trazia os sapatos feitos, sempre com a recomendação dos pais de deixar uns centímetros a mais, para o crescimento do pé, pois aqueles sapatos seriam muito poupadinhos, só quando estavam já a deixar de servir é que se podiam calçar à vontade.
Julieta tinha comprado pois para esta ocasião especial da ida à feira, umas meias de algodão com riscas horizontais e multicores, ao Sr. António Madeira. O Sr. Madeira era um vendedor ambulante que vinha vender pelas terras num Fiat cinzento com as portas a abrir ao contrário, ao contrário, sim, do que hoje acontece com as portas dos modelos de carros. Ora essas eram umas meias fantásticas que chegavam até ao joelho, e fez ainda, a Julieta, umas saias de xadrez todas pregueadas e vincadas, que elas adoravam.
Vestiram as saias com camisolas iguais tricotadas pela mãe, estavam todas bonitinhas e ei-las quase na hora da saída quando vêem chegar, descendo a estrada, alguns colegas de escola, que vinham pedir o ‘pão por Deus’.
Ali na fazenda havia de todos os frutos, e até várias qualidades da mesma espécie, com fartura de tudo, a avó Joaquina secava muitos figos, tudo se aproveitava, até as maçãs e pêssegos a avó cortava e secava ao sol, às rodelas ou em pedaços, fazia passas de uvas, das que ela sabia serem boas para passar, e depois havia os frutos de Inverno, as romãs grandes e de boa qualidade.
Por isso mesmo algumas das crianças lá da terra, mais desfavorecidas, ou que pelo menos não tinham a fartura que havia ali, e porque era hábito, sabiam onde ir pedir o ‘pão por Deus’.
Ali estavam com os seus saquinhos de retalhos a pedir, tal como iriam a outras casas, onde procuravam enchê-los antes de regressar a casa. Dalila foi falar à mãe, que logo lhe deu um açafate de frutos secos para que elas distribuíssem pelos seus amigos. Como seria natural, Dalila e Amália estavam muito excitadas, com o seu dia tão especial e, não os deixaram ir embora sem primeiro lhes contar as novidades, de que iam para a feira, queriam partilhar com eles a aventura daquele dia.
*
Chegara agora a hora da arrumação e partida, veio o tabuleiro do almoço dentro da alcofa, assim como o bolo - que merecia uma atenção especial das meninas - e tudo o resto necessário, para comer durante o dia, até os pratos e talheres para o serviço. Com todos os aconchegos requeridos para se acomodarem na carroça, lá foram subindo pela via acima, até chegarem à estrada principal de macadame. Aí, todos felizes e contentes subiram para a carroça, onde havia duas tábuas de assento, uma para os pais e outra para as crianças, duas mantas recobrindo esses assentos para ficarem mais confortáveis.
A viagem era de quinze quilómetros, mas naquela hora, a meio da manhã, e com bom tempo, seria muito agradável de fazer. Já todos acomodados lá iam partir, a carroça e o macho bonitos e enfeitados, os pais preparados e muito vaidosos, sentados no banco da frente, com a Graciete no meio deles - era a mais pequenita – e no assento virado para trás iam Dalila, Amália e Lisete.
A vaidade cresceu principalmente quando iam a passar pela terra vizinha de Atalaia, de onde Deodato era nascido e criado, ao passar pelos seus conterrâneos, até Dalila sentiu isso, porque estavam todos felizes da vida, naquele dia especial de Todos os Santos.
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O DIA DE TODOS OS SANTOS
O Dia de Todos os Santos era um dia muito importante na infância de Dalila, pelo menos naquele ano era a primeira vez que ia à Feira dos Santos e isso fazia a diferença, para o pai, contudo, era por outros motivos, ele gostava das feiras por gostar de fazer os seus negócios.
Para Julieta era o prazer de partilhar naquele dia um programa com o marido, e em família, coisa que pouco acontecia, o que portanto a deixava muito feliz. Todo esse dia era preparado e pensado muitos dias antes, pelo menos por Julieta, que tinha as filhas e farnel para arranjar.
Deodato só se preocupava com o transporte que ele já tinha preparado ao pormenor, era a pintura da carroça que serviria para transportar toda a família e que já tinha sido toda pintada de azul, as ferragens eram pintadas em preto, e o pai tinha até colocado umas rodas de carro, ou rodas de pneu adaptadas na carroça, e estava pois toda bonita a geringonça.
Ele gostava muito de a modificar a seu jeito, era como se fosse o seu verdadeiro carro. Depois vinha o abrilhantar dos metais que ornamentavam os arreios do macho, o cabedal era ensebado com sebo de carneiro que o pai sabia preparar, e nos arreios todas as fivelas de metal amarelo estavam reluzentes, assim como a guizeira, com seus guizos de cobre pendurada no pescoço, brilhante e tocante - com o trotar do macho faziam uma música constante que se ouvia a larga distancia.
Todas as pessoas olhavam, dava nas vistas, com uns enfeites de rabos de raposa muito lindos com fitinhas de várias cores, por sua vez dependurados, um de cada lado das orelhas - o pai era mesmo muito vaidoso com todos aqueles apetrechos da carroça e respectivo macho, para a viagem.
Julieta tinha morto uma boa galinha na véspera. De manhã acendeu o forno de lenha, bateu um bolo, apressadamente, para aproveitar o mesmo calor e cozer tudo de uma só vez. Estando o forno devidamente aquecido, nele foi colocado o bolo, assim como a galinha a corar, já previamente meia cozida, e barrada com tempero, e no entretanto foi fazendo um arroz no caldo da galinha, meio cozido coloca-o depois no tabuleiro à volta da ave, mais rodelas de chouriço a decorar o arroz. Volta tudo ao forno para acabar de cozer e corar, e ali estava preparado o grande almoço que seria comido na feira do Cartaxo, a feira de Todos os Santos.
O PÃO POR DEUS
Depois do banho tomado, dentro do grande alguidar que lhes servia de banheira, a mãe vestia-as com a melhor roupa, como nesta ocasião para irem à feira. Dalila e sua irmã Amália, como eram as mais velhas, andavam quase sempre vestidas de igual, diga-se a propósito, e até os seus sapatos pretos eram iguais e feitos de encomenda ao sapateiro da serra, como lhe chamavam, que seria da Benedita, terra de sapateiros.
Ele ia por todas aquelas pequenas aldeias, tirava o molde do pé num papel pardo, um risco de lápis, fazendo o molde do pé, e de volta trazia os sapatos feitos, sempre com a recomendação dos pais de deixar uns centímetros a mais, para o crescimento do pé, pois aqueles sapatos seriam muito poupadinhos, só quando estavam já a deixar de servir é que se podiam calçar à vontade.
Então, todos os dias, para os aproveitar bem até ao fim, andava-se até com os pés doridos, roídos ou, por vezes, cortando os sapatos nas biqueiras, mas eram os sapatos melhores, e tinham de acabar com eles, mesmo até ao fim.
Julieta tinha comprado pois para esta ocasião especial da ida à feira, umas meias de algodão com riscas horizontais e multicores, ao Sr. António Madeira. O Sr. Madeira era um vendedor ambulante que vinha vender pelas terras num Fiat cinzento com as portas a abrir ao contrário, ao contrário, sim, do que hoje acontece com as portas dos modelos de carros. Ora essas eram umas meias fantásticas que chegavam até ao joelho, e fez ainda, a Julieta, umas saias de xadrez todas pregueadas e vincadas, que elas adoravam.
Vestiram as saias com camisolas iguais tricotadas pela mãe, estavam todas bonitinhas e ei-las quase na hora da saída quando vêem chegar, descendo a estrada, alguns colegas de escola, que vinham pedir o ‘pão por Deus’.
Ali na fazenda havia de todos os frutos, e até várias qualidades da mesma espécie, com fartura de tudo, a avó Joaquina secava muitos figos, tudo se aproveitava, até as maçãs e pêssegos a avó cortava e secava ao sol, às rodelas ou em pedaços, fazia passas de uvas, das que ela sabia serem boas para passar, e depois havia os frutos de Inverno, as romãs grandes e de boa qualidade.
Por isso mesmo algumas das crianças lá da terra, mais desfavorecidas, ou que pelo menos não tinham a fartura que havia ali, e porque era hábito, sabiam onde ir pedir o ‘pão por Deus’.
Ali estavam com os seus saquinhos de retalhos a pedir, tal como iriam a outras casas, onde procuravam enchê-los antes de regressar a casa. Dalila foi falar à mãe, que logo lhe deu um açafate de frutos secos para que elas distribuíssem pelos seus amigos. Como seria natural, Dalila e Amália estavam muito excitadas, com o seu dia tão especial e, não os deixaram ir embora sem primeiro lhes contar as novidades, de que iam para a feira, queriam partilhar com eles a aventura daquele dia.
*
Chegara agora a hora da arrumação e partida, veio o tabuleiro do almoço dentro da alcofa, assim como o bolo - que merecia uma atenção especial das meninas - e tudo o resto necessário, para comer durante o dia, até os pratos e talheres para o serviço. Com todos os aconchegos requeridos para se acomodarem na carroça, lá foram subindo pela via acima, até chegarem à estrada principal de macadame. Aí, todos felizes e contentes subiram para a carroça, onde havia duas tábuas de assento, uma para os pais e outra para as crianças, duas mantas recobrindo esses assentos para ficarem mais confortáveis.
A viagem era de quinze quilómetros, mas naquela hora, a meio da manhã, e com bom tempo, seria muito agradável de fazer. Já todos acomodados lá iam partir, a carroça e o macho bonitos e enfeitados, os pais preparados e muito vaidosos, sentados no banco da frente, com a Graciete no meio deles - era a mais pequenita – e no assento virado para trás iam Dalila, Amália e Lisete.
A vaidade cresceu principalmente quando iam a passar pela terra vizinha de Atalaia, de onde Deodato era nascido e criado, ao passar pelos seus conterrâneos, até Dalila sentiu isso, porque estavam todos felizes da vida, naquele dia especial de Todos os Santos.
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