sexta-feira, 17 de setembro de 2010

O AVÔ ZÉ E A SORTE GRANDE

14º CAPITULO

O AVÔ ZÉ E A SORTE GRANDE

A situação da maleita quase fatal passou, o avô Zé Franquinho melhorou e, logo que se sentiu um pouco capaz, lá foi ele à vida. E assim acrescentou a sua com mais uns cinco anos, em que continuou a trabalhar, a somar ainda muitos quilómetros de estrada nas suas já frágeis pernas e, como tinha dado um salto ‘para fora da cova’, era porque tinha ainda muitas coisas a fazer neste mundo.

Tinha mesmo de acontecer alguma coisa mais importante na sua vida, e num dia de sorte para ele para outro senhor da Ponte do Celeiro, o José Afoito, ele vendeu-lhe a sorte grande, que nessa época dos anos cinquenta era de cem contos, e foi a loucura para aquela grande família.

Eram três irmãos os Afoitos, cada um com a sua casa de família, que formavam um grande núcleo familiar, onde houve festa da grande e, como todas as festas do povo, foi festejada com foguetes a estalar no ar para que toda a aldeia soubesse da alegria.

Foi o avô Zé ‘Franquinho’ Frade com eles a Lisboa levantar o dinheiro na Santa Casa, e foi logo ali que o dinheiro começou a ser distribuído. O ganhador da sorte grande deu algum dinheiro ao avô, em agradecimento, e logo em Lisboa, do primeiro dinheiro que ele gastou, parte foi a comprar alguns metros de tecido para Julieta fazer um vestido a cada uma das netas, que já eram quatro.
Quando chegou a casa, muito feliz, foi entregar o embrulho à sua filha Julieta, vinha atado com um fio, e disse que era para ela fazer uns vestidos para as netas. O tecido era bonito, era uma chita com fundo azul e toda repleta de bolinhas multicores com muitos tamanhos, e Julieta fez uns vestidos de corpo liso, decote quadrado e saia franzida.

Dalila adorava o seu, ficava-lhe lindamente, e como era de tecido fino colava um pouco no corpo, já se fazia adivinhar a elevação do peito, o que já a deixava toda vaidosa. Nunca esqueceu aquela prenda do seu avô Franquinho, poderia ter sido a única, mas para ela tinha valido por uma vida inteira.
*
Certo dia, passados uns cinco anos o avô voltaria a adoecer, esteve poucos dias doente e a avó viu que ele não conseguia levantar-se. A avó disse a Dalila que lhe fosse lavar a camisa melhor, ou a mais nova, ele tinha-a vestido para sair. A avó estava a trabalhar na costura, e pediu pois à neta que fosse ela ao tanque lavar a camisa para pô-la a secar, ‘podia acontecer alguma coisa’.

Recomendou que a esfregasse bem nos punhos e o também o colarinho, com sabão, e à mão, bem esfregadinho, e assim fez ela, pegou na camisa e foi para o tanque, aquele mesmo onde uma vez tinha caído. A camisa era clássica, branca, com risquinhas azuis, comprada por ele na casa das camisas, até tinha esticadores no colarinho. Dalila achava-a linda e fez tudo como a avó lhe recomendou.

Molhou, ensaboou, esfregou, bateu bem na pedra para sair bem o sabão, espanejou bem na água, espremeu, torceu muito bem, até as suas forças, ou o seu jeito lhe dar. Por fim estendeu no arame, bem ao jeito de lhe entrar o vento por dentro, e como gostava ela de apreciar, ver assim um estendal de roupa onde o vento entrava por dentro, parecendo até ter os corpos lá pendurados e a balouçar no arame.

Na verdade foi desta vez que o avô se foi para sempre e o funeral foi mesmo para Santarém, a avó mandou colocar uma lápide e, quase sempre, futuramente, Dalila iria com ela arranjar a campa e pôr flores.

Julieta comprou luto, vestiu-as de azul-escuro com pintinhas brancas, fez uns bibes com folhos no corpo e umas fitas na cintura para dar um laço atrás, eram bem bonitos e jeitosos. E assim lá iam para a escola, agora, como a mãe dizia, ‘bem compostas’, para que as pessoas não fizessem critica pela falta de luto pelo avô Zé.

CONTINUA NO PROXIMO CAPITULO

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